A recepção da TSF em Nova York

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RECEPÇÃO DA T.S.F. EM NOVA-YORK


Estou certo de que a maioria dos amadores portugueses vae ler com surpreza, talvez com incredulidade, a seguinte afirmação:

Durante um mês que estive em Nova-York tendo experimentado quasi diariamente com um aparelho de recepção, não ouvi uma interferência radio-telegrafica nem um assobio devido á reação de outro aparelho.

Devo acrescentar, que também não notei a prevalência de atmosféricos. Nova-York é um dos portos do mundo de mais intenso trafico comercial; mesmo os pequenos vapores dos serviços do porto, saúde, correios, etc., teem instalações radiotelegraficas.

O trafico internacional, feito por estações de grande potência, sitas relativamente visinhas da cidade, é também intensissimo.

E portanto, não é ahi a recepção notavelmente dificultada pelas interferências d’esses serviços. As condições locais de recepção, comquanto curiosamente peculiares, só por si não o explicam.

Um estudo intitulado “Interferência” aparecido, no numero de agosto de 1923, da publicação do Instituto dos Radio-Engenheiros, refere-se ás condições existentes no fim de 1922, principio de 1923. Vê-se que nessa data os amadores queixavam se amargamente da interferência causada : por postos de faísca e arco, em fundamental ou harmónicas, linhas de transmissão em mau estado, motores, etc.

Como, do estado de coisas em 1923, se chegou ao que observei em maio de 1925, não tive eu tempo de cabalmente averiguar mas é obvio que isso foi devido: a uma legislação adequada, a um esforço unido de todos os interessados e á compreensão de que milhares de pessoas não podem ser incomodadas, a não ser n’um caso excepcional, por qualquer interesse particular.

As associações fizeram inquéritos entre os seus consócios perguntando quais os postos que mais incomodavam, dirigindo-se-lhes depois directamente ; pequenas modificações foram introduzidas de modo a purificar as transmissões, quanto possível, de harmónicas; cópias feitas por amadores do serviço diário de certos postos foram submetidas a entidades respectivas demonstrando a inutilidade de grande parte d’ele.

Havia até uma estação da marinha, que distando de outras poucas centenas de metros se entretinha a transmitir-lhe por Radio, mensa gens de pouca importância, quando o podia fazer usando a linha telefónica directa.

Da amabilidade de Sua Ex.a o Sr. Ministro da America em Lisboa, espero obter dentro en breve toda a legislação Americana sobre este assunto e então de novo virei perante os leitores com uma analise da mesma.

A ausência de interferência devida a outros receptores é devida em grande parte a :
Um bom serviço local, fácil de sintonisar o que não obriga o amador a um esforço continuo, em geral com aparelhos inadequados, para conseguir ouvir postos a longa distancia.

Abstenção da maioria dos comerciantes da venda de aparelhos a reação.

Educação do amador.

Legislação e ação das associações.


Sobre atmosféricos devo dizer que me informaram eles se notarem sobretudo mais para o verão e que a cidade estava numa zona relativamente previlegiada pois que de facto nunca ali teem a intensidade com que se fazem sentir nos districtos visinhos.

Tendo mostrado o que numa legislação inteligente e o que o esforço e concurso de todas as boas vontades ali conseguiu, resta-me fazer votos para que no nosso país o publico em geral e especialmente aqueles que teem por obrigação zelar pelo interesse comum, se compenetrem da importância da radio-difusão e que com um pouco de boa vontade é facílimo melhorar as nossas actuais condições de recepção.

Como acima escrevi as condições locais de recepção e transmissão são sobremodo curiosas devido ás enormes carcassas de ferro que formam o arcaboiço dos skyscrapers. Quando se entra o porto e se chega em frente da cidade, notam-se imediatamente, sobre um d’eles, duas enormes torres em T, inegavelmente construídas para suportar a antena de uma estação de transmissão.

Pela ausência de fio vê-se porém que não está em uso.

Mais tarde perguntando a que estação pertenciam as torres, informaram-me:
Foram construídas para a instalação final da estação WEAF, que é uma das melhores, senão a melhor de Nova-York.

Essa estação foi primeiro instalada n’um sitio provisório onde as transmissões foram notáveis. Quando as torres estavam prontas fizeram a mudança; o resultado foi que a eficiência diminuiu de mais de 50%. Tornaram a muda-la para o antigo sitio, continuando a dar ali explendidos resultados.

A perda de eficiência devido á absorção das massas metálicas é tal, que na cidade mesmo é difícil, senão impossível, ouvir-se mais do que as estações locaes.

Apesar de em Portugal ter por diversas vezes ouvido WQY, a estação da General Electric, Scheneckdy, relativamente perto de Nova-York, nunca ali a conseguia ouvir.


Almir MARTINS

Nota: Foi preservado o português original