

Eu sou mesmo assim, gosto de coisas antigas, principalmente rádios e objetos de uso geral usados noutros tempos, como, por exemplo, candeeiros, máquinas de petróleo, telefones, etc.
Lá por 2005, em que andava mais entusiasmado em comprar rádios, depois começou a ser um hobby muito caro, em conversa com um amigo que vive na Hungria, perguntei-lhe se por lá não haveria algum rádio interessante, do tempo da URSS, daqueles feitos pelo regime e para o regime, tal como acontecia com os Travant.(*)
De fato, a antiga RDA fabricava um recetor extremamente simples, frágil e com apenas duas emissoras de rádio, pré sintonizadas num comutador de 2 posições.
O meu amigo conseguiu num antiquário um em excelente estado. O preço era, para a nossa fasquia de comprador europeu, uma pechincha, 20 euros.
Venha lá o rádio. Dei-lhe as indicações para fazer uma boa embalagem e tratei de encontrar alguma transportadora.
Pensava eu que na Hungria operavam transportadoras comuns como temos no resto da Europa, DHL, UPS, Chronopost, etc. Apenas operava a UPS e queria 300 euros pelo transporte para Portugal. Era o resultado da falta de concorrência.
A única possibilidade era o transporte por correio normal.
Reforcei o pedido para que a embalagem fosse bem feita uma vez que a viagem seria longa e os trambolhões, muitos. O custo, ainda assim, não era muito generoso, mas era a única alternativa.
Embalado, enviado, começou a espera.
As semanas passaram, passou um mês, passou quase outro e nada do rádio.
Não tinha qualquer referência, nem número de registo, nem paradeiro. Reclamei nos correios mas a única solução seria esperar e rezar para que não se perdesse.
Um dia o carteiro chegou com um aviso para levantar o rádio. Foi sorte, porque no dia seguinte iria viajar de férias para o estrangeiro.
E lá fui eu levantar o caixote.
Surpresa! Estava num mísero estado, todo rasgado e aberto.
Quando cheguei a casa, ao abrir o que ainda faltava, verifiquei que o rádio estava todo partido. Caixa em vários pedaços, uma válvula quebrada e o chassis amassado.
Fiquei desolado e, para não pensar mais no assunto, pelo menos naquela altura, fechei a caixa e levei para o sótão.
Passaram-se alguns meses. Um dia resolvi voltar a abrir a caixa e reavaliar o estrago. O chassis era fino, não seria difícil reparar o estrago. A válvula não era identificada, mas, como o rádio nunca voltaria a funcionar, encontrei outra fisicamente semelhante. Pior era a caixa, tanto mais que a bricolage em madeira nunca foi o meu forte.
Mas achei que era uma peça interessante, representante de uma época e símbolo da filosofia de vida de um povo que teve pouca sorte depois da segunda guerra.
Entreguei os pedaços da caixa a um restaurador muito competente, que já me tinha feito outros trabalhos anteriormente. O rádio ficou como se pode ver, impecável, não ostentando qualquer marca do acidente que sofreu. E foram mais 50 euros!
No fim, algo que era tentadoramente barato, acabou por ficar por mais do que estava na conta. Mas valeu a pena, foi mais um salvo do contentor do lixo!
(*)O Trabant (companheiro de viagem, em alemão) foi um automóvel produzido pela VEB Sachsenring Automobilwerke, resultado da fusão das antigas Audi e Horch, na Alemanha democrática, entre 1957 e 1991.
Por ser de construção extremamente frágil e de prestações técnicas muito modestas, era considerado o carro do povo.