Air Tight ATM-1 - A renascensa do classicismo
No início da década de oitenta o mundo da alta fidelidade está perfeitamente cristalizado e é algures muito parecido com o que conhecemos hoje. A Audio Research e a Conrad Johnson, com a ajuda dos seguidores Americanos, reinam nas mais altas esferas do hi-fi, ao qual os jornalistas deram o nome de topo de gama "high-end" em inglês.
Pela primeira vez na história da disciplina, são as novas empresas que escrevem as regras do jogo e não as marcas clássicas. Estas últimas, de qualquer forma, já perderam a essência que as animava à excepção da McIntosh e da QUAD.
A Marantz e a Harman Kardon estão na mão de grupos japoneses e apostam mais na quantidade que na qualidade. Na Inglaterra a QUAD, continua a escrever a história, mas a transístores desta vez.
As veneráveis Leak, Radford, etc já não existem. Em contrapartida novas marcas como a Michaelson & Austin (do Tim de Paravincini "EAR Yoshino"), Audion e Audio Innovations, estão prontas a nascer e irão perpetuar a tradição Inglesa.
Na Dinamarca Ole Môller está prestes a lançar o Copland CTA 401, e na França a Verdier e Yves Cochet produzem confidencialmente alguns aparelhos a válvulas. Na Alemanha a Kebshull, Dr Klimo e a Orange audio estão prestes a lançar a gama deles.
Como se vê, a válvula vive, cresce e ganha terreno, mas as nuvens no horizonte continuam escuras e ameaçadoras.
É preciso notar que nesta época todas as válvulas utilizadas são o stock existente dos anos 60/70. Os industriais não acreditam no retorno total das válvulas, e as poucas que são ainda produzidas no ocidente, são com finalidades militares.
Sem a confiança dos industriais das válvulas, o futuro continua incerto, e o perigo de se esgotar os stocks, está na mente de todos os construtores, criando o receio geral. No Japão a situação é clara, todos os grandes construtores pararam a produção de aparelhos a válvulas à excepção da Luxman que tem ainda para o seu prestígio um modelo em catálogo, o MQ 360, mas que quer acabar de uma maneira definitiva a produção deste último.
Um homem está no resguardo das decisões da Luxman, e não por acaso, pois é ele o criador dos últimos modelos a válvulas da marca. A ideia que o "saber fazer", ou seja o Know-how Japonês em válvulas desapareça, não é aceitável.
Em 1985 com a ajuda de um sócio cria uma marca "testemunho" para perpetuar a arte japonesa e impedi-la de morrer. Este homem chama-se A. Miura e é o pai do primeiro aparelho, e o mais respeitado, da Air Tight, ou seja o ATM-1, que será o nosso hóspede durante este capítulo.
Apresentação
O ATM-1 é ao nível do circuito um aparelho clássico, uma espécie de herdeiro à Japonesa do Marantz 8B, que os japoneses veneram tanto.
Mas isto é em aparência somente. Na realidade o ATM-1 cristaliza a maestria da escola audiófila japonesa num aparelho comercial, e isto pela primeira vez na história.
Em aparência o ATM-1 é um aparelho a válvulas clássico no design e na implantação dos componentes. Mas um olhar atento revela alguns elementos raros para a época. Os transformadores de saída são de um tamanho excepcional em relação às EL34 que o equipam. Fabricados pela Tamura que é a "Bentley" dos transformadores japoneses e dimensionados para passar o dobro ou o triplo da potência total (36 watts), asseguram uma linearidade sem falha a todas as frequências. São uma obra prima, cujo preço faria hesitar qualquer construtor.
Mas não é tudo, uma olhada furtiva para o corpo "chassis", mostra o nível de perfeição deste último. Fabricado em França nos Alpes, próximo da Suíça, é o apogeu da perfeição metalúrgica Francesa. Não há defeito algum, NADA. No interior é a mesma coisa. A cablagem ponto a ponto em homenagem aos pioneiros QUAD, McIntosh é de uma perfeição total, e foi escolhida segundo os parâmetros da escuta.
Os componentes são todos de uma qualidade última, sem excepção. Nenhum traço ou resto de soldadura é visível no interior, e isto é a prova do espírito obsessivo de fabrico deste aparelho.
Utiliza diodos a válvulas em vez dos solid state afim de levar a tradição ao máximo e obter a delicadeza de reprodução que esta técnica bem utilizada procura.
O último ponto que faz este aparelho particular é o número de entradas. Só possui duas, uma à frente e uma atrás, o que faz dele um aparelho pouco típico, pois não é nem um integrado nem verdadeiramente um amplificador de potência. Dois potenciómetros permitem regular individualmente o nível sonoro de cada canal.
Pode-se considerar o ATM-1 como sendo um amplificador integrado minimalista. A maior parte dos aparelhos chineses de hoje, tentam em vão, copiar a nobreza, bem como os códigos de fabrico deste aparelho, o que faz dele neste aspecto um verdadeiro modelo.
Vantagens
Como todo aparelho "testemunho", ou seja, baseado num esquema clássico antigo, fiável e musical, mas equipado com os melhores componentes do momento e um "saber fazer" proprietário, o ATM-1 é um amplificador "acabado" ao nível dos resultados da escuta. A fiabilidade é excepcional e o resultado da escuta está ao nível dos meios utilizados. A polarização automática faz dele um aparelho sem preocupações de utilização. As válvulas usadas são fáceis de encontrar. O estatuto de integrado minimalista, permite ligar directamente uma ou duas fontes.
É verdadeiramente ao nível estético e de fabrico um belo e nobre objecto. Este aparelho faz renascer o estilo clássico a válvulas.
Inconvenientes
Visto que o esquema não é original, é impossível revolucionar a escuta. Este aparelho vai muito mais longe do que os aparelhos nos quais se inspirou, mas a veia é a mesma. É este o limite destes exercícios de estilo.
Outro inconveniente é a origem. Até aos anos noventa a produção japonesa "audiófila" é desdenhada no ocidente. Foi preciso esperar o reconhecimento, tardio, da escola audiófila japonesa para que a Air Tight alcançasse a reputação e o prestígio que possui hoje.
Escuta
Como todos os grandes aparelhos, o ATM-1 acumula paradoxos. O som é contemporâneo, moderno mesmo, e muito afastado do estilo que a sua tecnologia faria imaginar. A dinâmica é muito boa e em osmose permanente com o ritmo. Os timbres são belos mas sem excessos, uma certa forma de pudor invade a escuta deste aparelho. A sua justeza e objectividade são exemplares, e obrigam o ouvinte a ser um iniciado para compreender estas qualidades. A capacidade de controlo das colunas faz pensar (sem atingir) em aparelhos mais modernos com alimentações complexas. Mas os finais de nota e a paleta harmónica assinam a utilização de diodos a válvulas e a qualidade extrema dos componentes.
No fim o aparelho perturba, pois comparando o mundo clássico e o moderno, cria um estilo à parte que é necessário assimilar.
Um amplificador que é uma estrela ainda muito longe de perder o seu brilho. uma máquina excepcional.
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