
No pós-II Guerra Mundial, a aquisição de um recetor de rádio era uma marca de modernidade. Por essa época, os jornais traziam publicidade de muitos modelos de recetores, ainda de dimensões grandes se comparados com os produzidos desde finais da década de 1960. A explicação residia nos componentes eletrónicos. Antes, as válvulas grandes e a irradiarem muito calor, pelo que precisavam de caixas grandes para escoar as temperaturas; depois, os pequenos transístores, com muito pouco consumo.
Por isso, ler a vinheta publicada a 30 de outubro de 1947, traz dúvidas. Primeiro, a mulher representada podia ser míope, como declara. Depois, talvez o preço do recetor fosse elevado para a bolsa do casal, pelo que ela concluiu daquele modo, a lembrar a fábula atribuída a Esopo e reescrita por La Fontaine, “estão verdes, não prestam”, com a raposa a não chegar às uvas. Em terceiro, e menos provável, os recetores estavam a miniaturizar-se. Mas os transístores ainda não tinham chegado ao mercado.
Fica a imagem: o rádio de todas as ondas e correntes tinha o lugar de destaque na montra. Melhor: não tinha concorrência. Se pudéssemos ouvir o recetor, talvez estivesse a tocar música de dança ou um programa de variedades tipo Serão para Trabalhadores ou um noticiário ou uma menos interessante palestra política. Ou ainda um relato de futebol. Foi nessa época que a rádio iniciou tais programas, primeiro só com o relato na segunda parte, temendo que os simpatizantes desportivos ficassem em casa e não demandassem os estádios. Ainda me recordo de ouvir Artur Agostinho ou José Amadeu de Freitas, mas já não me lembro de Ayala Boto ou Alfredo Quádrio Raposo.