Teatro radiofónico rápido (18)

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"Encontros e reencontros de Alice e Alberto"

Nota prévia: este teatro radiofónico é ficção.

12 (último episódio)

Voz N: caros membros da assembleia municipal das Caldas da Rainha, autoridades religiosas, militares e civis, convidados, minhas senhoras e meus senhores. Estamos aqui presentes para homenagear a insigne caldense que foi a professora Alice Caeiro. Deputada, professora do ensino secundário e da Faculdade de Letras e antropóloga, é com muita alegria que procedemos à apresentação em livro da sua última investigação. Passo de imediato a palavra ao senhor Alberto Fonseca.

Alberto: senhor presidente, outras individualidades. Agradeço muito o convite para estar aqui, mas sinto-me pouco objetivo ao falar de Alice Caeiro, pois privei intimamente com ela durante mais de dez anos. Assim, vou falar com muita saudade, espero que sem emoção à vista para manter coerente o discurso. Foi aqui nas Caldas da Rainha que ela me falou, pela primeira vez, do trabalho de recolha de memórias escritas, visuais e sonoras que começou quando professora em Castelo Branco. Nascida em 1929 aqui, ela acabou a licenciatura de filologia e linguística em 1952. Entre 1954 e 1959, foi assistente de programas literários na Emissora Nacional, onde preparou textos de programas de cultura e de música clássica e escreveu ainda notas para serem lidas nos noticiários. Eu, que também trabalhei na Emissora, mas anos depois, testemunhei os elogios sobre ela naquela casa. Com vinte e seis anos, em 1957, Alice Caeiro começou a lecionar na faculdade de letras como assistente do professor Prado Coelho. Não chegou a concluir o doutoramento, o que ela lamentou bastante nos seus últimos anos de vida.

Em 1965, concorreu a deputada e manteve-se na assembleia nacional até 1969. No período, defendeu causas da região de Leiria, em especial no reconhecimento e promoção da indústria cerâmica das Caldas. Também as obras de desassoreamento da Lagoa de Óbidos estiveram presentes nas suas intervenções. Ela defendeu ainda o trabalho dos funcionários da Biblioteca Nacional. No fim do mandato, ela regressou à faculdade, onde lecionou literatura portuguesa. Ao mesmo tempo, foi publicando com êxito diversas obras. Escreveu sobre Camilo e Eça de Queirós, histórias para crianças (quase trinta livros, incluindo traduções), Teatro para Gente Miúda – em que eu também colaborei na sua construção – e textos para adolescentes, nomeadamente meninas.

Em 1974, Alice Caeiro foi demitida de funções na universidade e foi docente nas escolas secundárias de Castelo Branco e de Caldas da Rainha. Por questões de saúde, deixou o ensino em 1978, vindo a falecer em 1983, há três anos, pois. Num período relativamente curto, de 1974 a 1977, não a acompanhei, por estar envolvido em atividades teatrais e políticas, como conselheiro de informação em comissão da Assembleia da República. Talvez o período de maior isolamento dela.

O livro que agora se publica, num esforço da câmara municipal, em especial devido ao seu presidente, amigo da família da autora, é, como disse atrás, um projeto que ela acarinhou entre 1975, quando colocada na escola de Castelo Branco, e, mais ou menos, em 1981, quando já debilitada, e na sua casa em Lisboa, achou pronto o trabalho. Esta última obra é uma viragem na sua escrita, já não no domínio da ficção para crianças e jovens, mas na procura de raízes populares das gentes que ela encontrou. Como metodologia, partiu dos alunos, para perceber se tinham avós. Depois, num dia da semana em que não lecionava ou ao sábado, ia de autocarro, visitava essas pessoas e punha-as a falar para um gravador. De início, os entrevistados sentiam-se constrangidos, mas, minutos depois, já falavam da cultura local, dos antepassados, das histórias sobre eles e das famílias, e dos lugares, profissões e festas. Começou depois do Natal e com base nas ideias de uma associação de defesa do património cultural que se formou com o entusiasmo de um colega da autora. Visto o resultado, ela repetiria aqui nas Caldas da Rainha, um território bem mais familiar.

De uma estrutura inicial de pessoas, profissões antigas e costumes locais, ela evoluiu e destacou algumas histórias. A que acrescentou números e dados etnográficos – nascimentos, casamentos, propriedades, fábricas e lojas de algumas das localidades –, fazendo do livro uma quase enciclopédia crítica. Com relevo óbvio para esta cidade. Na sua pesquisa, recolheu também canções populares que, agora, ficam no património da câmara. Obrigado.

[aplausos]

[separador musical. Acabamos de ouvir Teatro Radiofónico. Último episódio de Encontros e reencontros de Alice e Alberto. Texto de, produção de, direção de atores de, atores, vozes de, sonoplastia e montagem de]

Nota do autor: comecei por uma muito curta biografia de Ester de Lemos e de Rui Paixão Pedro, antigos profissionais da Emissora Nacional. Uma história de amor seria difícil de concatenar como a existente entre Maria Leonor Magro e Pedro Moutinho. As diferenças estéticas e de valores eram grandes para existir química amorosa neles. Por isso, criei as personagens Alice Caeiro e Alberto Fonseca e, com alguns traços biográficos dos profissionais acima identificados, criei uma história. Nunca foi objetivo reabilitar posições vividas pelas figuras reais em que me inspirei. Quando principiei, não sabia como ia acabar. O final melodramático não foi o mais ousado, mas faltou inspiração para melhor. Obrigado a quem foi comentando, a partir de alguns elementos que escrevi.

[recorte Diário Popular, 10 de agosto de 1974]